“Navegando à deriva”:

Notas etnográficas sobre o turismo em Ilhéus, Bahia

 

 

Drift sailing”:

Ethnographic notes about tourism in Ilhéus, Bahia

 

Roque Pinto[1]

 

 

RESUMO: Este texto se propõe a discutir alguns aspectos relacionados à atividade turística na cidade de Ilhéus, localizada no litoral sul da Bahia, centrando-se especialmente nas relações que os empresários ligados à atividade turística estabelecem com o lugar e de que modo tais relações influenciam o próprio sistema turístico local. As investigações foram norteadas por uma metodologia qualitativa, baseada na coleta de dados com vistas à descrição etnográfica. Utilizou-se como técnicas de investigação a observação participante, a aplicação de entrevistas semi-estruturadas e não-estruturadas junto a usuários e gestores públicos e privados e a aplicação de questionários em estabelecimentos de alojamento. De acordo com os resultados da investigação, o gap entre os recursos disponíveis e os atrativos efetivamente formatados para o turismo na cidade, bem como a incipiência das ações públicas e as deficiências do setor privado no turismo local representam apenas sintomas – e não causas – de um problema cujo fulcro se encontra na invisibilidade do turismo enquanto atividade produtiva e vetor de desenvolvimento sócio-econômico desde o ponto de vista do poder público.

Palavras-chave: Turismo. Ilhéus. Bahia. Desenvolvimento.

 

 

Abstract: This paper attempts to discuss some issues on tourism in Ilhéus City, located in south Bahia State, Brazil, focusing mainly on relations between local entrepreneurs and the place and trying to analyze in which ways those relations influence the local touristic system itself. It stems from a qualitative research based on data from ethnographic descriptions. Research techniques such as participant observation, semi-structured survey and non-structured survey were used, and the subjects were consumers as well as public and private managers. Surveys in lodging facilities were also performed. As an outcome, it can be said that the gap between available resources and attractions effectively created for tourism, as well as the lack of action from both public and private sectors on local tourism, represent only the symptoms – and not the causes – of a problem which is centered in the invisibility -for public adminstration-, of tourism as a way for social and economic development.

Key words: Tourism. Ilhéus. Bahia. Development.

 

 

Desde que se viram sem mastro, sem leme e sem velas, ficou-lhe a nau lançada no bordo da terra. (Relação da Mui Notável Perda do Galeão Grande S. João. Moçambique, 1553).

 

 

Introdução

 

Este trabalho pretende discutir sobre o imbricamento entre a política local e o desenvolvimento do sistema turístico na cidade de Ilhéus, no litoral sul da Bahia, enfatizando as relações que os gestores públicos e privados estabelecem com o lugar, e de que modo essas mesmas relações influenciam o próprio sistema turístico.

Propõe-se uma abordagem qualitativa, baseada na descrição etnográfica e fundada na observação participante. Os dados empíricos aqui referidos aludem às atividades de campo realizadas nos períodos de julho de 2006 a março de 2007 e novembro de 2007 a março de 2008 em Ilhéus, e consistiram, fundamentalmente, na  (a). coleta de dados primários com vistas à descrição etnográfica; (b). aplicação de 20 questionários junto a establecimentos de alojamento; e (c). 31 entrevistas semi-estruturadas com indivíduos relacionados direta ou indiretamente com o turismo na cidade.

As aportações que se seguem referem-se aos trabalhos de investigação tutorados e dirigidos pelo professor doutor Agustín Santana Talavera e norteados pelo projeto de tese doutoral intitulado Padrones Actitudinales de Gestores en el Turismo en Ilhéus, Brasil, inscrito na linha de investigação Territorio, Pesca, Turismo y Gestión de Recursos no Departamento de Prehistoria, Antropología e Historia Antigua da Universidad de La Laguna, Tenerife, Espanha.

 

Desenho da investigação

 

 

Dentro do subsistema estático[2] observado privilegiou-se o ponto de vista dos gestores públicos e privados, embora também fossem realizadas entrevistas com usuários de equipamentos turísticos e moradores da cidade de Ilhéus e de outras próximas (sendo que esses dois últimos grupos se sobrepõem no contexto empírico, como se verá).

O problema central a que se refere essa investigação é balizado pela idéia de que a percepção da área turística pelos empresários e gestores públicos varia numa escala que vai de disposições econômico-racionais a disposições subjetivas-emocionais, que corresponderiam, respectivamente, à apreensão da área como recurso ou como lugar (quadro 1):

 

 

          

                 Disposições                                                     Disposições

               econômico-racionais                                             subjetivas-emocionais

         

                Recurso                                                                       Lugar

(território para exploração)                                          (território para viver)

 

Quadro 1 - Escala de percepção de gestores e investidores no sistema turístico

Fonte: Elaboração própria

 

 

Essa escala pode ser averiguada através das atitudes e tomadas de decisões desses gestores, especialmente em relação ao nível de participação e interferência destes no aparato político que envolve o sistema turístico como um todo.

Sem embargo, no plano empírico investigado se verifica uma defasagem entre os recursos naturais, culturais e logísticos que dispõe a cidade e os atrativos efetivamente formatados para o turismo. E esse descompasso pode ser creditado em parte à própria percepção dos executivos locais sobre o território, em função das disposições cognitivas, afetivas e conativas que compõem sua visão do lugar.

É importante ressaltar que tanto a Secretaria de Turismo de Ilhéus quanto a Bahiatursa (órgão oficial de fomento ao turismo do Estado) e a Secretaria de Turismo do Estado da Bahia não dispõem de estatísticas atualizadas sobre o turismo na região e particularmente sobre a cidade, de forma que o aporte quantitativo relativo ao campo investigado viu-se claramente prejudicado, ao que se procurou compensar com entrevistas em profundidade aplicadas a gestores ligados ao setor turístico da cidade, numa proporção que pode ser estimada entre 25% e 30% do universo dos estabelecimentos turísticos existentes – uma vez que não se tem dados precisos sobre a quantidade destes[3].

Ademais, procurou-se categorizar tais estabelecimentos de forma que a eleição dos entrevistados obedecesse a critérios de proporcionalidade no sentido de apresentar com o maior rigor possível a correlação entre o peso político e a significância local de cada categoria de estabelecimento com a quantidade de entrevistas colhidas por categoria. Do mesmo modo, os informantes que figuram na investigação foram selecionados segundo sondagens prévias em que apresentaram uma massa significativa de dados no âmbito dos objetivos propostos no trabalho[4].

Assim, a metodologia aplicada no trabalho de campo foi eminentemente qualitativa, baseada na coleta de dados com vistas à descrição etnográfica (CAMPBELL; LEVINE, 1973; MEAD, 1973; GARCÍA JORBA, 2000). Utilizou-se como técnicas de investigação a observação participante (ANGUERA ARGILAGA, 1995), conjuntamente com a aplicação entrevistas semi-estruturadas e não-estruturadas junto a usuários e gestores públicos e privados ligados ao setor turístico local e aplicação de questionários (CAUHÉ AGUIRRE, 1995; DUVERGER, 1996; VALLES, 1997; GARCÍA GARCÍA, 2000) junto a estabelecimentos de alojamento.

 

 

Antecedentes: ascensão e queda dos “frutos de ouro”

 

 

A cidade de Ilhéus se localiza numa baía circundada por morros, situada à latitude S14° 47' 20" e longitude W 39° 2' 58", a cerca de 460 km ao sul de Salvador, capital do Estado da Bahia. Ocupa uma área de 27.074,70 Km2 e possui cerca de 200.000 habitantes, a metade deles estabelecida na zona urbana do município.

Fundada como vila da Capitania de São Jorge dos Ilhéus em 1535, Ilhéus foi oficialmente convertida à categoria de cidade em 1881. A partir de meados dos séculos XIX Ilhéus e seu entorno – a região sul da Bahia – experimentou uma vigorosa economia baseada na monocultura do cacau (Theobroma cacao).

Os “frutos de ouro” foram o principal produto da pauta de exportação do Estado da Bahia entre as décadas de 1900 e 1970 (GUERREIRO DE FREITAS; PARAÍSO, 2001). A produção cacaueira no sul da Bahia atingiu seu apogeu na primeira metade do século XX, quando a região isoladamente logrou ocupar o posto de segundo maior produtor e exportador de cacau do mundo.

Símbolos dessa riqueza poderiam ser vistos na iluminação pública da cidade, cujos postes foram importados da Inglaterra, como as pedras que pavimentam algumas de suas ruas centrais (nas primeiras décadas do século XX Ilhéus abrigava um vice-consulado britânico).

Mas o consumo perdulário e a ostentação poderiam ser percebidos com maior intensidade nas atitudes das famílias tradicionais, com a exibição de pianos de cauda inclusive nas sedes de fazenda ou compra de apartamentos de “veraneio” em Paris ou mesmo em Tóquio, como relataram alguns informantes. Ou, concretamente, quando em 1918 o coronel[5] Ramiro Ildefonso de Araújo Castro construíra uma residência em Ilhéus idêntica em todos os detelhes ao Palácio do Catete, sede do governo federal à época (HEINE, 2004, 41; PINTO, 2005).

Nesse sentido é emblemático o depoimento de um informante que chegou a Ilhéus no final da década de 1970, isto é, já no lusco-fusco do “ciclo de ouro” do cacau, mas ainda assim em busca de uma riqueza que circulava desproporcionalmente em relação ao restante do país:

 

Quando eu cheguei aqui [em 1977] era uma época pujante e a idéia era se fixar por causa da riqueza, da ostentação econômica que havia na época. Ilhéus tinha, junto com Itabuna, proporcionalmente mais veículos novos do que em São Paulo. Nós éramos uma cidade rica[6], a grande maioria dos fazendeiros tinha apartamento na Europa, passeava uma ou duas vezes pela Europa [...]. Eu vim do Rio de Janeiro, onde o máximo que um sujeito de classe média conseguia [lograr] era chegar numa faculdade com um pai que tinha uma casinha, um carrinho de classe média. Classe média em Ilhéus era quem colhia três mil e quinhentas arrobas de cacau, quer dizer, o 'cara' podia comprar oitenta pick-ups por ano (L., Hoteleiro).

 

Com efeito, a pujança econômica, o alto nível de renda de parte da população e o distanciamento político e cultural da região cacaueira em relação a outras áreas do Estado – especialmente a capital – chegaram a convergir num sentimento separatista[7], uma vez que repercurtia cada vez mais alto as vozes que então arrogava para a porção sul da Bahia o epíteto de “civilização do cacau” (ADONIAS FILHO, 1976).

Pari pasu à expansão da área de cultivo do cacau deu-se a interiorização das plantações e a conseqüente articulação de Ilhéus com outras partes da região, especialmente com o município de Itabuna, pela via férrea.

Com a conexão entre a ferrovia em Itabuna (inaugurada em 1913) e o porto em Ilhéus, o eixo Ilhéus-Itabuna se conformou como o "bipólo líder do subsistema urbano mais bem estruturado do Estado na primeira metade do século XX" (SEI, 2007), configurando-se assim como o mais importante atrator econômico e demográfico da região, sendo Itabuna o núcleo do comércio varejista e de serviços e Ilhéus o centro de comercialização, exportação e industrialização do cacau.

Contudo, uma crise que se arrastara lentamente sobre a lavoura cacaueira desde a década de 1960 foi açodada pela praga “vassoura-de-bruxa” a partir do início da década 1990[8]. Com alterações profundas na sua paisagem econômica, a região passa a sofrer fortes pressões demográficas, com o êxodo massivo de famílias da zona rural em direção principalmente às cidades de Ilhéus e Itabuna, que experimentam um aumento populacional desordenado e o respectivo surgimento de vários bairros precariamente urbanizados ou não-urbanizados, derivados de ocupações espontâneas.

Com a redução do monocultivo do cacau a 30% da área originalmente cultivada, e com a ausência de qualquer sinal de melhora a curto prazo, começa-se a pensar alternativas econômicas ao “fruto de ouro”, dentre elas o turismo (CERQUEIRA, 2002), sobretudo considerando (a) os recursos naturais locais; (b) as extensas faixas litorâneas até então praticamente inexploradas; (c) uma considerável rede de alojamentos sub-utilizada, montada para satisfazer à demanda dos comerciantes de cacau; e (d) uma forte imagem midiática ligada às obras do escritor Jorge Amado, autor do romance “Gabriela, Cravo e Canela”, ambientado na cidade de Ilhéus e que, adaptado à televisão, logo tornou-se um grande sucesso da teledramaturgia brasileira não só dentro do país como também no exterior (CUNHA, 2003; 2004; PINTO, 2008).

 

Figura 1 - Visão do mirante de Serra Grande, localizado entre Ilhéus e Itacaré.
Foto: Roque Pinto

 

 

Ilhéus, “a terra de Jorge Amado”

 

 

A paisagem urbana de Ilhéus é desarmônica, entrecortada: não há continuidade arquitetônica em nenhuma das ruas centrais da cidade. Prédios "modernos" emergem entre casarões históricos. A rede de ruas paralelas do centro da cidade é ocupada por comércio de roupas e eletro-eletrônicos, bancos, lanchonetes, lojas populares, prédios comerciais e "prédios históricos" – construções a que se atribui valor de patrimônio (turístico, histórico, cultural), como a casa de Jorge Amado, o teatro de Ilhéus ou o próprio prédio da prefeitura.

No núcleo central da cidade, donde se pode ver alguns grupos de turistas com guias ou turistas isolados, casais ou famílias a fotografar ou a passear pelas calçadas, encontram-se condensados seus principais atrativos turísticos: o Bar Vesúvio, um importante local de convergência de visitantes, tanto pela sua centralidade quanto pelo fato de ser uma espécie de emblema da cidade - fora propriedade do “turco” Nacib, um dos protagonistas do romance Gabriela, Cravo e Canela, e um cenário privilegiado na trama[9] -, a Casa de Jorge Amado (onde o escritor viveu parte da sua juventude), o Teatro Municipal, o Palácio Paranaguá, sede da prefeitura, e a Catedral de São Sebastião.

 

Figura 2 - Turistas tirando fotos com escultura de Jorge Amado.

Foto: Roque Pinto

 

 

Esta última se situa numa das extremidades da Avenida Soares Lopes, que acompanha a extensão da Praia da Avenida e que abriga, na outra extremidade, o Centro de Convenções e um espaço aberto para shows, a concha acústica.

Seguindo esta mesma avenida, na direção da Catedral, chega-se à Praia do Cristo – onde se encontra uma réplica em menor escala do Cristo Redentor – e à Avenida Dois de Julho, onde se localiza o Bataclan, que fora o mais famoso cabaré da cidade e a que se atribuía uma vigorosa vida noturna até a primeira metade do século XX, e hoje se encontra reformado, com um espaço para eventos, um cyber-café e um quarto como móveis de época que seria a réplica daqueles usados pelas dançarinas nas primeiras décadas do século passado.

 

Figura 3 - Recepcionista no Bataclã, reproduzindo indumentária característica das dançarinas.

Foto: Roque Pinto

 

 

A poucos metros se tem o Ilhéos Hotel, um prédio neoclássico construído na década de 1930 pelo coronel Misael Tavares, quase em frente ao antigo porto, este com uma parte transformada em estacionamento público. Assim, a parte turisticamente ativa no centro da cidade é condensada num retângulo imaginário de mais ou menos 500 metros de lado.

Do outro lado da baía, atravessando a ponte do Pontal, tem-se a idéia de que se chegou a uma outra localidade. O Bairro do Pontal, que margeia a baía de mesmo nome, tem sua própria dinâmica. O lugar, onde se situa o aeroporto Jorge Amado, fora uma aldeia de pescadores relativamente isolada da “cidade”, isto é, do centro de Ilhéus. Somente em 1966 que se construiu a única ponte que o liga ao outro lado da baía, isto é, “a Ilhéus”, como ainda hoje alguns antigos moradores se referem ao centro da cidade.

Na avenida Lomanto Junior, a principal via do Pontal, a Colônia de Pesca e os pequenos bares e restaurantes imprimem uma arquitetura urbana distinta daquela que se vê no centro. O local é mais arborizado e as vias mais amplas. O ritmo é mais lento e o burburinho das ruas quase inaudível.

A avenida é toda ladeada por mansões construídas na "época áurea" do cacau (muitas delas já “desmembradas” em mais de uma casa ou transformadas em clínicas, restaurantes ou pousadas). Chama a atenção o edifício mais alto dali, um hotel em estado quase falimentar que já fora uma referência de distinção da cidade.

As praças do Pontal são sombreadas por amendoeiras e suas ruas apresentam uma combinação de antigas casas de pescador, térreas e sóbrias, com construções modernas, em geral casas amplas ou pequenos prédios de três ou quatro andares. Próximo à praça central do bairro há um pequeno comércio e nas quadras paralelas, próximas ao aeroporto, predominam as casas mais antigas e alguns bares frequentados por locais.

Seguindo na direção sul se tem a pista do aeroporto, alguns aglomerados populares e o bairro Jardim Atlântico, que apresenta uma grande concentração de pousadas e condomínios de classe média e que, juntamente com o Pontal, é zona preferencial de moradia dos forâneos que se estabelecem na cidade.

Este bairro é a porta de entrada da Praia dos Milionários ou Praia do Sul, a mais movimentada de Ilhéus, e que possui cerca de 30 cabanas de praia – que consistem em bares e restaurantes feitos de madeira e piaçava alinhados  entre a praia e a rodovia Ilhéus-Olivença.

Algumas dessas cabanas apresentam uma grande estrutura para recepção de clientes, contando com dezenas de mesas, aparato de som ao vivo, espaço para shows e grande quantidade de garçons e cozinheiros. Outras, mais simples, trabalham com não mais do que um cozinheiro, um ou dois garçons e um gerente (que muitas vezes é o mesmo proprietário).

A Praia do Sul não é urbanizada e as cabanas não são padronizadas. Aos fins de semana muitos ambulantes circulam pela praia vendendo souvenires, “artesanato hippie”, CDs piratas, brincos e colares feitos à mão, brinquedos, camisetas, saídas de praia, petiscos vários (queijo coalho, camarão seco, abarás e acarajés, ostras frescas) etc.

 

          Figura 4- Praia do Sul.

          Foto: Roque Pinto

 

 

No verão de 2006-7 se verificou uma ocupação mais baixa do que nos anos anteriores nas cabanas de praia, incusive com um movimento menor do que nos fins de semana ordinários fora do verão (quando a ocupação se dá majoritariamente por uma clientela itabunense). A isso os cabaneiros atribuíram ao fato de que, por falta de opção de ócio, a maioria dos turistas – mesmo aqueles que pretendiam ficar apenas uma semana na cidade – haviam se deslocado para Itacaré e/ou outras localidades próximas.

Durante a baixa estação muitas cabanas são fechadas, só voltando a ser reabertas em dezembro. Fora dos meses de dezembro e janeiro as cabanas atingem seu limite de ocupação apenas aos domingos, sobretudo com a presença dos moradores de cidades próximas.

De fato, uma das peculiaridades do turismo em Ilhéus é que a maioria dos usuários dos seus equipamentos turísticos são habitantes da cidade contígua de Itabuna (30 km de distância). É dizer, o suporte econômico que nutre o aparato turístico em Ilhéus advém do turismo de proximidade: os itabunenses e os moradores de outras cidades circunvizinhas sustentam em grande medida a estrutura de turismo de Ilhéus na maior parte do ano, em especial aos fins de semana e principalmente em relação aos serviços ligados a praia, bares e restaurantes, embora em menor intensidade também utilizem as serviços de day use e hospedagem em hotéis e pousadas.

Seguindo em direção ao sul tem-se as localidades de Cururupe, Acuípe e Olivença. Nesta última, os maiores atrativos são as praias, pequenas enseadas ocupadas por algumas cabanas; o Batuba Beach, uma mega-cabana de praia com restaurantes temáticos, pizzaria, pequenas lojas de souvenir e um amplo espaço para espetáculos; e o Balneário de Tororomba, um complexo de águas termais que dispõe de serviço de bar, restaurante e pequenas lojas.

Os “nativos”, isto é, a população indígena de Olivença, dispõe de horários “especiais” para frequentar as termas, de modo que lhes é vedado o acesso no período em que os banhistas desfrutam o lugar. Segundo um encarregado, "é para não 'misturar' e não 'espantar' os turistas" – Olivença é uma área litigiosa por ter sido um aldeamento Tupinambá[10].

Desse modo, em termos gerais, os principais locais de visitação de Ilhéus (enquanto destino turístico) são o "Centro Histórico", a Praia dos Milionários (Praia do Sul) e Olivença. O ótimo da relação oferta-demanda do sistema turístico local se dá apenas no mês de janeiro, embora também apresente boas taxas de ocupação nos meses de dezembro, fevereiro e junho (este último por conta das festas juninas e das pequenas férias do meio do ano).

 

 

          Figura 5 - Cabanas de Praia em Olivença

          Foto: Roque Pinto

 

 

Dada a falta de alternativas de ócio, a cidade vem sendo utilizada pelos turistas como um ponto de apoio para visitas a outras localidades, como Itacaré, Maraú, Barra Grande e Canavieiras – o que se verifica empiricamente no esvaziamento das praias e dos bares e restaurantes na alta estação, como observaram os cabaneiros da Praia do Sul.

De acordo com Pesquisa de Demanda Turística de Ilhéus (2002), a maioria dos visitantes ocupam alojamentos não-hoteleiros, já conhecem a cidade e, via de regra, possuem amigos e/ou parentes na cidade. Há uma discrepância entre a incipiente promoção turística e o quase inexistente planejamento da atividade por parte dos poderes públicos, que avaliam o quadro de turistas como advindo de metrópoles não-litorâneas de fora do Estado (Belo Horizonte, Brasília, Goiânia, São Paulo), enquanto que os dados de campo apontam para uma massa de visitantes eminentemente regionais.

Em termos logísticos, a cidade possui acesso aéreo, terrestre e marítimo, respectivamente através do aeroporto Jorge Amado, que mantém vôos diários para as cidades de Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo (INFRAERO, 2004); pelas rodovias BR-101, BR-415 (federais) e BA-001 e BA-262 (estaduais); e pelo Porto de Malhado, por onde recebe regularmente cruzeiros de várias partes do mundo[11].

 

 

A política e os gestores

 

 

Considerando o material analisado no escopo da investigação, a imagem turística de Ilhéus é norteada pela percepção da defasagem entre os recursos (naturais, simbólicos e logísticos) e os atrativos da cidade e do seu entorno, sendo este o principal fator limitante da estabilização e expansão da demanda turística:

Aqui não tem nada. Aqui não tem [opções de lazer] para jovem, por exemplo... o quê que um jovem da idade do meu filho, que tem quinze anos, tem pra fazer aqui em Ilhéus? Nada. Não tem nada... a cidade está mal organizada, toda esburacada, toda suja, a praia suja, ninguém cuida nem da praia que é a única atração que tem aqui na cidade... Não tem o poder publico aqui da cidade. Não se faz absolutamente nada pra melhorar isso, nada. (D, pousadeira).

 

Esse problema é um sintoma causado por um conjunto de elementos estruturais, principalmente de natureza política, que acabam por obstruir a implementação de melhorias no receptivo referentes à limpeza urbana, à qualificação da mão-de-obra, ao planejamento da atividade e à conservação do patrimônio.

Sem embargo, os principais problemas apontados na pesquisa estão em consonância com os resultados apresentados por alguns trabalhos desenvolvidos no âmbito do Mestrado em Cultura e Turismo da Universidade Estadual de Santa Cruz, localizada nesta mesma cidade (CAIRO, 2003; MIRA, 2003; DORIA, 2004; MENEZES, 2004; OLIVEIRA, 2004; LEMOS, 2005; SOUZA, 2005), e por outros autores que se dedicaram ao tema (MENEZES, 1998; CERQUEIRA, 2002; MATA, 2004), mormente ligados a:

1  Má conservação, precariedade e problemas de acesso a equipamentos turísticos, nomeadamente estabelecimentos de alojamento, praças e pontos turísticos;

2  Ineficiência dos serviços públicos básicos, principalmente limpeza urbana, segurança pública e ordenamento e sinalização do trânsito;

3  Estrutura deficiente de serviços ligados ao ócio e ao entretenimento;

4  Qualidade irregular e custo elevado dos serviços oferecidos[12].

Contudo, o que os autores apontam como sendo “o problema” do turismo em Ilhéus (mão-de-obra, hospitalidade, serviços públicos, equipamentos turísticos), na verdade parece representar apenas “a parte visível” de uma questão mais entranhada no tecido social local (PINTO, 2006; 2007).

De acordo com as evidências empíricas arroladas, o fulcro do “problema Ilhéus” está na inconsistência do turismo como projeto político e sua invisibilidade junto às administrações municipais como um agente econômico e um vetor de desenvolvimento local:

 

Eu acho que Ilhéus é uma cidade com potencial turístico, mas eu não acho uma cidade turística porque não oferece tudo que o turista precisa. Se eu fosse dar uma nota de zero a dez eu daria cinco, cinco porque nós temos alguns equipamentos interessantes, a natureza generosa demais, uma história riquíssima, tem personagens atrelados a nossa marca Ilhéus conhecido no mundo inteiro... Tudo de negativo que poderíamos encontrar numa cidade estamos encontrando aqui hoje na cidade, a cidade infeliz. A cidade está suja, a cidade está mal iluminada, a cidade está com as vias ruins, a cidade está com seu patrimônio histórico degradado, a cidade precisa ter sua história resgatada, a educação não está a contento, a saúde deficiente, os equipamentos em sua maioria sofrendo pra se manterem vivos, sem promoção do destino, sem promover o turismo... eu não posso achar que isso é positivo, e não é graças a esse governo [municipal], não. Isso vem acontecendo ano após ano, esse governo só agravou. [A cidade] não tem poder político há muitos anos, eu acho que nunca teve. Desde que eu moro aqui que eu nunca ouvi falar, somente alguns ensaios muito superficiais, muito a curto prazo... e politiqueiros. (M., empresário da área de marketing).

 

Com isso, verificam-se não só as persistências desses problemas, como também a sua agudização ao longo do tempo, como indicam as vozes do empresariado[13]:

O principal problema da cidade é o descaso com que a cidade é tratada. Por exemplo, aqui em Ilhéus eu trabalhei um fim de semana eu tive uma coleta de lixo durante todo o fim de semana e hoje [quarta-feira] eu tive outra, quer dizer, a gente está convivendo com um problema sério de lixo, é uma cidade abandonada, esburacada, depauperada, isso jamais uma cidade turística poderia ter, é [falta de] zelo, só isso. Eu classifico o turismo em Ilhéus como amador, por isso que eu estou aqui, porque eu sou amador, quero me tornar um profissional, uma coisa bem prática, me esforço, leio bastante sobre o assunto, mas o turismo aqui é amador, muito amador. (R., cabaneiro).

 

Segundo os dados de campo, parte dos proprietários locais encara o turismo como uma atividade provisória, um modo alternativo e relativamente precário de fazer circular dinheiro enquanto o cacau não volta a reunir condições – de crédito, de erradicação de pragas, de preço no mercado internacional, de oferta de terras férteis – para alcançar patamares de lucratividade semelhantes àqueles obtidos até mais ou menos a década 1970. Contudo, essa mentalidade representa a fração menor do empresariado, em geral formada por naturais da região.

Caso se definisse o empresário de turismo em Ilhéus como um tipo-ideal, se teria que esse sujeito é um forâneo residente na cidade há não mais do que 15 anos, nunca teve experiências anteriores com o turismo, possui rendimentos regulares oriundos de outras fontes (aposentadoria, bens de raiz  ou outros empreendimentos), e que elegeu a cidade para viver como uma alternativa de “qualidade de vida”, um lugar onde se poderia concretizar “o sonho de se aposentar e abrir uma pousada num paraíso em frente ao mar”.

Isso explicaria em parte a inércia política da categoria. A partir desses dados se pode inferir que esse segmento empresarial não atingiu uma “densidade moral” (à Durkheim) que se refletisse num grau de associativismo capaz de alterar a balança de poder local, uma vez que se nota uma flagrante incapacidade destes empresários de fazer valer seus interesses no contexto das políticas públicas em Ilhéus.

Dizendo de outro modo, a ineficiência associativa do setor obsta o exercício de pressões mais efetivas sobre a municipalidade não só no sentido de implementar políticas voltadas estritamente para o turismo, como também de prover melhorias gerais que repercutiriam positivamente na atividade turística, direcionadas para o saneamento básico, a segurança pública, o ordenamento do trânsito ou a urbanização e iluminação de vias públicas.

De acordo com os dados empíricos arrolados, pode-se construir um quadro analítico a respeito dos gestores privados do turismo na cidade a partir das seguintes premissas:

I Um grande percentual dos empresários do setor turístico de Ilhéus é composto por adventícios;

II Esses indivíduos não tinham uma intenção prévia deliberada de instalar um empreendimento turístico na cidade;

III Não possuem formação técnica na área de turismo e nunca haviam lidado com essa atividade antes;

IV O turismo "surge" como uma "alternativa natural" dadas "as belezas naturais e o potencial turístico da cidade";

V A principal motivação desses indivíduos para se fixaram em Ilhéus é a "qualidade de vida", um ideal que contrastaria com o modus vivendi das grandes cidades urbanas de onde advêm;

VI Ainda que estejam descontentes com os resultados financeiros dos seus negócios seguem satisfeitos em viver na cidade, em que pesem seus problemas estruturais e conjunturais;

VII Embora verbalizem a respeito do turismo como uma atividade necessariamente interconectada com outros setores da sociedade, na prática suas ações se limitam ao gerenciamento do próprio negócio;

VIII A capacidade de intervenção de entidades representativas do setor turístico e dos conselhos deliberativos nas instâncias decisórias locais é bastante limitada;

 

Levando em conta essas assertivas, pode-se divisar um padrão de conduta dos empresários do setor turístico de Ilhéus baseado em alguns elementos discretos:

 

a) Isolamento político (ao menos enquanto "classe");

b) Ações empresariais e tomada de decisões definidas ad-hoc, sem planejamento de longo prazo, e de curtíssimo alcance – "eu estou fazendo a minha parte, da porta pra dentro..."; 

c) Indissociablidade do negócio com o ócio: as categorias "tempo", "espaço" e "trabalho" funcionando de modo distinto ao que se atribuiria um sentido estritamente capitalista;

d) Relação com o território enquanto um lugar para viver e não como um lugar para explorar: "ganhar dinheiro" seria uma espécie de efeito colateral desejável mas não imprescindível.

 

Desse modo, uma das hipóteses de trabalho iniciais, de que um ethos derivado do monocultivo do cacau seria central para compreender o mundo do turismo em Ilhéus, parece não se verificar totalmente. Por outro lado, pode-se inferir que pelo menos colateralmente essa "mentalidade extrativista" influi nas atitudes dos empresários e pode, sim, impingir nas suas decisões, no sentido a) de uma visão imediatista e atomicista e b) de uma idéia de ciclo agrícola tipo "safra e temporão" transplantada para o turismo, isto é, na alta estação é quando se “colhe” os dividendos do turismo, e na baixa estação é o tempo de “arrumar a casa” para o verão.

 

 

Conclusão

 

 

Um dos aspectos mais relevantes para o entendimento das particularidades do sistema turístico ilheense é a relação que os empresários locais estabelecem com a cidade. É unânime a idéia – especialmente influenciada pelas obras midiáticas de matriz jorgeamadiana – de viver "num lugar com qualidade de vida", "longe do estresse da cidade grande" e que "se possa desfrutar da natureza e dormir com a porta aberta" (embora na prática já não se possa gozar de tamanha tranquilidade).

Essas motivações, por seu turno, inscrevem-se no bojo da situação econômico-financeira desses próprios empresários, na medida em que muitos deles prescindem do negócio turístico para sobreviver, por disporem de rendas alternativas.

Com isso, verifica-se uma atitude que no limite poderia ser classificada, paradoxalmente, como “anti-capitalista” no sentido de não procurar maximizar seus lucros nem se preocupar em manter seus negócios no limite da sua capacidade de carga, o que aponta para uma relação peculiar desses indivíduos com o lugar, sintetizada numa frase recorrente nas entrevistas: "o negócio vai mal, mas não quero sair daqui nunca”.

Assim, tem-se que o evaziamento da ação coletiva dos gestores frente ao poder público pode ser creditada, por um lado, à incapacidade de um associativismo eficiente e eficaz – “essas reuniões são só pra perder tempo, nada se resolve” –, e por outro lado, à eleição prioritária de resolver seus problemas de forma individual, replicando o sistema clientelista de negociação, “falando com um e com outro amigo [político]”.

Em relação aos gestores públicos, tem-se que sua visão do que seja “turismo” é de curto alcance e em geral se confunde com hotelaria. Portanto, estes não percebem o turismo como uma atividade produtiva strictu sensu e tampouco enxergam seu alcance econômico (potencial e efetivo).

Além disso, o setor é encarado como "pouco rentável" tanto em termos políticos (montante de votos) como em termos tributários (montante de arrecadação): segundo alguns vereadores, o turismo geraria um capital político escasso porque tanto a arrecadação direta de impostos (cerca de 5% do total dos tributos municipais) quanto a população de eleitores vinculada à atividade seriam pouco significativas no contexto de uma economia das trocas políticas.

Por outro lado, a visão dos políticos em relação ao turismo é obscurecida não apenas pela incapacidade de fazer uma avaliação sistêmica da atividade, mas também pela falta de dados objetivos sobre a quantidade e os tipos de estabelecimentos que a cidade dispõe e pela falta de interlocução com os empresários ligados ao turismo.

A perspectiva do poder legislativo não difere muito da ótica do executivo municipal sobre o tema. Reiteradas vezes os secretários de turismo da cidade reclamavam da falta de recursos e de problemas de articulação com outras secretarias municipais (de infra-estrutura, de planejamento, de obras)[14].

Inclusive fora sublinhado que o prefeito pensava a questão turística como um "problema dos empresários", restrito ao âmbito da hotelaria, e que "por Ilhéus ser Ilhéus os turistas vêm de qualquer jeito". Desse modo, para o poder municipal a atividade turística é encarada como um fenômeno espontâneo e marginal que agrega pouco valor econômico para a cidade e pouco coeficiente político para si.

O reflexo dessa postura no plano espacial, territorial, na arquitetura urbanística e sociológica da cidade e do seu entorno é uma imagem de abandono: as maiores queixas dos turistas sobre a cidade é o descaso com o patrimônio, a falta de limpeza, a falta de segurança e a quase inexistência de opções de ócio, reflexo de uma defasagem entre as demandas públicas – saneamento básico, educação básica, limpeza urbana, iluminação, segurança – e as ações governamentais na cidade.

Com efeito, no período da coleta do material etnográfico o então prefeito se situava muito aquém das expectativas dos seus eleitores[15] e, sobretudo, enfrentava vários escândalos de improbidade administrativa, desvio de recursos, favorecimentos ilícitos, emprego de parentes na máquina púbica e pagamento de suborno a vereadores[16].

Além disso, as atribuições próprias do poder municipal parecem ser executadas de improviso, sem planejamento e sem solução de continuidade, com falhas de comunicação e interação entre as secretarias municipais. E, desse modo, a infra-estrutura básica para a implantação de um sistema turístico integrado à localidade segue comprometida.

Sem embargo, os círculos mais altos do setor público em Ilhéus encaram o turismo como uma latência e um porvir e, especialmente, como um discurso politicamente conveniente, inclusive porque ele é mais valioso como promessa de campanha política do que como uma realidade efetiva.

Nesse sentido se verifica, tanto nas instâncias públicas quanto privadas, uma grande lacuna entre a retórica e as ações pragmáticas voltadas para o turismo, o que se constitui como um dos principais fatores limitantes do desenvolvimento dessa atividade em Ilhéus, panorama que pode ser resumido na fala de um empresário local: “Estamos aí a navegar à deriva, onde a maré nos levar estamos indo.

 

 

 

 

 

Referências

 

 

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Recebido em: novembro de 2008

Aprovado em: dezembro de 2008

 



[1] Professor de Antropologia na Universidade Estadual de Santa Cruz (Ilhéus, Brasil) e doutorando em Antropologia Social pela Universidad de La Laguna (Tenerife, Espanha). E-mail: roquepintosantos@gmail.com.

[2] Para uma discussão mais aprofundada sobre o sistema turístico ver: Beni (1993); Mathieson e Wall (1990); Simonicca (2001); Santana Talavera (1997; 2002); Burns (2002).

[3] Vale apontar que a própria ausência de dados oficiais sobre o turismo na cidade já representa por si só um importante dado etnográfico referente ao tratamento que o poder público dispensa ao turismo local.

[4] Especialmente em função dos resultados do projeto de pesquisa Turismo, Status e Consumo em Ilhéus, financiado pela Universidade Estadual de Santa Cruz (Ilhéus, Brasil), e realizado no período de 2004 a 2006 (PINTO; SANTOS, 2006).

[5] “Coronel” era o título que se atribuía aos grandes fazendeiros, independentemente destes o possuirem oficialmente. Inclusive porque, na fase de expansão das lavouras, estes se revestiam em comandante-em-chefe de milícias armadas formadas por “jagunços” e grande parte do respeito que gozavam vinha da quantidade “de homens que derrubara nas matas, nos tempos do barulho.” (FALCÓN, 1995; AMADO, 2000).

[6] É interessante notar nesse depoimento como os adventícios se agregam e são agregados à cidade de forma a constituírem como parte dela quase que automaticamente. De fato, a partir do ciclo do cacau Ilhéus se estabeleceu com a chegada massiva de “forasteiros” (categoria êmica local). Muitos coronéis eram naturais de Alagoas, Sergipe, Ceará ou do norte do Estado. Posteriormente comerciantes e exportadores do sul do país e mesmo do exterior se assentaram na região – e todos se tornaram igualmente “ilheenses” ou “grapiúnas”. Vale notar que um dos distintivos culturais da região deriva dos fluxos regulares de imigrantes sírios e libaneses desde fins do século XIX e que preferencialmente se estabeleciam no então florescente comércio local. Ademais, a própria “saga do cacau” começaria com as primeiras mudas trazidas do Pará pelo francês Louis Frédéric Warneaux.

[7] Esse separatismo foi corporificado no lobby montado na Assembléia Constituinte de 1988 para aprovar o desmembramento da região do resto do Estado da Bahia, criando o Estado de Santa Cruz.

[8] Embora a maioria dos podutores creditem a crise da cacau à rápida disseminação da praga vassoura-de-bruxa (Crinipellis perniciosa), hoje comprovadamente vinda da Amazônia, onde alguns fazendeiros ilheenses possuíam plantações, o fato é que o débàcle do cacau no sul da Bahia se deu tanto em função de fatores internos, com problemas ligados ao crédito e ao financiamento dos produtores, quanto em função de fatores externos, como uma série de flutuações cambiais da moeda brasileira nas bolsas estrangeiras, a queda do preço do produto no mercado internacional e o aumento de produtividade da cacauicultura de base familiar na costa ocidental africana.

[9] Mutatis mutandis, seu atual proprietário é um soteropolitano de origem italiana que antes de se mudar para Ilhéus era operador da Bolsa de Valores no Rio de Janeiro.

[10] Por muito tempo se negou a presença indígena no local, exatamente pelo fato de que Olivença se transformou em balneário para os mais endinheirados, e o reconhecimento legal de que ali seria terra indígena implicaria não só na desapropriação dos imóveis como refletiria, sobretudo, na questão do poder local: seria inimaginável para uma família “tradicional”, cujos antepassados “trouxeram a civilização” para região “rasgando e desbravando a mata selvagem”, perder parte do seu patrimônio para índios “que nem índios são mais”. Recentemente a região reviveu os conflitos, cujos efeitos se pode ver numa carta aberta disponível na página-web da Associação Brasileira de Antropologia (ABA, 2008).

[11] Segundo os guias locais, cerca de 70% dos turistas de cruzeiro que desembarcam em Ilhéus vão para Itacaré. Uma outra parte nem desembarca, de modo que apenas uma pequena parcela desse contingente se desabala para visitar a cidade. Entre os guias costuma-se dizer, a modo de chiste, que “Ilhéus é o receptivo de Itacaré”.

[12] Incluindo aí a falta de treinamento da mão-de-obra e a irregularidade da qualidade do produto/serviço oferecido: “não tenho coragem de indicar nenhum restaurante de Ilhéus ou do Banco da Vitória pra ninguém... hoje a comida está boa, mas amanhã não sei se vai manter a mesma qualidade, se o atendimento vai ser o mesmo”, diz um entrevistado.

[13] Seria importante ressaltar também o baixo grau de interação entre as instituições de ensino superior da região e o sistema turístico local. A investigação do porquê desse distanciamento, verificado tanto na extremidade dos gestores do turismo, quando na extremidade das faculdades e universidade, poderia indicar pistas interessantes para compreensão do problema mais amplo da estruturação do sistema turístico na região.

[14] Embora o orçamento para o turismo votado pela Câmara de Vereadores seja mais ou menos compatível com o “tamanho” do segmento, na prática esses recursos são contingenciados pelo executivo e canalizados para outras pastas ou “projetos” de maior conveniência política.

[15] Segundo Goldman (2006) é recorrente em Ilhéus avaliações negativas dos prefeitos nos seus últimos anos de mandato.

[16] De fato, no dia 31 de agosto de 2007 o tenente coronel Juvenal Teixeira, comandante do 2º Batalhão da Polícia Militar do Estado da Bahia, negociava a desocupação pacífica do Palácio Paranaguá, sede da municipalidade de Ilhéus. É que mesmo cassado o ex-prefeito se recusava a abandonar o prédio em favor do vice e se mantinha entrincheirado, protegido por uma milícia privada ao seu comando.